Brincar: uma ferramenta fundamental para desenvolver a comunicação
Alterações da comunicação são características do TEA; avaliação e acompanhamento fonoaudiológico podem ser importantes
As alterações na comunicação variam muito em cada autista. Encontramos desde indivíduos não verbais, que jamais desenvolverão a fala, até os que falam fluentemente. Há ainda os que possuem fluência, mas apresentam dificuldades no uso funcional da linguagem verbal, com falhas tanto para iniciar como para responder às diferentes demandas da comunicação.
Considerando que as alterações da comunicação social são características centrais do TEA, a avaliação e acompanhamento fonoaudiológico podem ser importantes.
Uma das intervenções é a chamada intervenção terapêutica direta. O profissional de fonoaudiologia planeja e executa as estratégias terapêuticas necessárias para cada caso. Trata-se de um trabalho individualizado e estruturado a partir dos dados colhidos na avaliação. Estes dados permitem criar um plano de intervenção específico, com estratégias que potencializam os pontos fortes e estimulam as dificuldades de cada um.
Principal estratégia terapêutica na intervenção direta é o brincar que envolve fonoaudiólogo e autista
O foco da intervenção terapêutica direta é o trabalho com os aspectos relacionados à linguagem, regulação emocional, habilidade cognitivas (de percepção e desenvolvimento dos sentidos) e comunicação social – que envolve a atenção compartilhada e a interação na relação social.
A principal estratégia terapêutica utilizada pelo fonoaudiólogo é o jogo, a brincadeira compartilhada, que tem a função de intermediar a relação entre paciente e terapeuta. É por meio da brincadeira que se constrói a linguagem da criança. Inicialmente, observa-se como ela explora sua imaginação. Em seguida, são incentivadas outras formas de brincar e de compartilhar a atenção.
As estratégias variam de acordo com o estágio do desenvolvimento da linguagem de cada autista. O objetivo é ajudá-los a construir a comunicação e habilidades sociais com diferentes parceiros e em ambientes diversos.
Em cada estágio do desenvolvimento da linguagem, há objetivos específicos a serem alcançados
A atuação do fonoaudiólogo junto à família e às equipes terapêutica e escolar, denominada intervenção indireta, é de grande importância para pessoas com autismo. Os pais e toda equipe recebem informações e orientações personalizadas, e são incentivados a assumir posturas atuantes e participativas no processo de desenvolvimento do autista.
Durante as sessões, ou logo quando acabam, é importante que o profissional compartilhe orientações e estratégias aos familiares e cuidadores, para que estes possam dar continuidade, fora do consultório, ao que foi ensinado.
Um estudo sobre os programas voltados para o desenvolvimento da linguagem em crianças com autismo leve revelou a importância de pensar além das palavras e frases para o desenvolvimento da comunicação e do uso da linguagem.
Capacidade de imitar, de olhar e de desenvolver atenção conjunta são tão importantes quanto a pronúncia adequada de palavras e frases
Programas de comunicação social demonstraram que pais, professores, profissionais e outros podem aprender esses métodos, mas eles exigem treinamento, prática e suporte contínuo. Até certo ponto, o sucesso dos programas de desenvolvimento pode depender do treinamento, acompanhamento e apoio do adulto mediador da intervenção – neste caso, pais e cuidadores, em especial.
Estudos de métodos centrados na criança demonstraram sua capacidade para aumentar a imitação, o olhar, a mudança de turnos e a atenção conjunta em autistas pré-verbais.
Outros estudos demonstram desenvolvimento na comunicação após o treino da atenção compartilhada. Uma pesquisa de 2006 sugere que o treinamento das habilidades de brincar e da comunicação não verbal podem melhorar a habilidade de adquirir a fala.
A intervenção para crianças com TEA nos estágios que ainda estão aprendendo a falar faz uma diferença importante e de curto prazo. Métodos de intervenção que usam vários estágios na orientação dos adultos demonstram ser eficazes em ampliar a linguagem e os comportamentos comunicativos.
Falta de profissionais capacitados e alto custo das intervenções são fatores preocupantes
O autismo é um espectro, que influencia o desenvolvimento de múltiplas maneiras, de acordo com as características de cada indivíduo. Portanto, são necessárias intervenções múltiplas e específicas em diversos estágios da vida, conforme as necessidades de cada um.
As intervenções chamadas de cognitivas sociais, que incorporam a prática de habilidades simuladas ou do mundo real, mostram-se bastante favoráveis a pessoas com autismo.
A preocupação na aplicação de programas de tratamento é a escassez de profissionais capacitados, o alto custo das intervenções e a dificuldade de acesso aos serviços públicos. Além disso, é importante acompanhar se as habilidades adquiridas durante a terapia são transferidas para outras configurações da rotina da pessoa ao longo do tempo. O resultado não pode se ater ao trabalho no consultório. O acompanhamento constante e de longo prazo dos pacientes ajuda a avaliar a longevidade e a aplicação do aprendizado terapêutico em todas as esferas da vida.
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Acessos:
Joana Portolese
Neuropsicóloga Coordenadora do Ambulatório de Autismo do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP).
Ricardo Vêncio
Pai de crianças dentro e fora do espectro, professor livre-docente no Departamento de Computação e Matemática FFCLRP-USP.
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