Meltdown: colapso nervoso em pessoas com autismo
Técnicas comportamentais incorporadas à rotina e até um software podem ajudar a identificar e reduzir a frequência das crises
Meltdown é um momento de crise, no qual há uma impossibilidade de controlar impulsos ou reações. Geralmente, ocorre em situações estressantes, como barulho intenso, frustração ou sobrecarga sensorial. O termo em inglês refere-se a “derretimento” e vem ao encontro, simbolicamente, das sensações vividas durante as crises, onde o sujeito apresenta um colapso na sua capacidade de gerenciar as próprias emoções e sentimentos.
Essas crises nervosas são acompanhadas de sintomas, como gritos, choros, enjoos, tremores, mal-estar ou comportamento autoagressivo. Muito diferente de uma birra, que é uma estratégia para conseguir algo que deseja.
Ferramenta consegue prever a ocorrência das crises por meio das expressões faciais
Um artigo publicado em agosto de 2021 apresenta um software de monitoramento, que captura, em tempo real, as expressões faciais dos indivíduos com autismo para prever meltdowns.
Os resultados obtidos em laboratório mostraram um bom desempenho na identificação de padrões de expressão facial, o que possibilitará a tomada de decisões em tempo hábil para o uso de medidas paliativas eficazes, minimizando a ocorrência de colapsos.
O uso de softwares é eficaz para diminuir a frequência de crises nervosas. A tecnologia, no entanto, não está disponível para a maioria da população. Por isso, existem algumas técnicas que podemos desenvolver no convívio diário, que são tão eficazes quanto os softwares.
Alimentos ou brincadeiras que agradem o autista podem funcionar como reforçadores de comportamento
Podemos utilizar o que chamamos de “reforçamento não contingente”, que consiste na apresentação de um reforçador, ou seja, um elogio social ou alimento, por exemplo, de maneira não contingente. Isto é, independentemente da ocorrência do comportamento-problema, há liberação do reforçador a cada intervalo determinado de tempo.
Na prática, poderia ser aplicado quando o autista está sentado de maneira calma na mesa, e o cuidador ou responsável oferece um reforço social, ou seja, brincadeiras com falas exclamativas.
Também pode ser um reforço alimentar, uma fruta de sua preferência, por exemplo. O reforço deve ser apresentado em um determinado intervalo de tempo (de um a três minutos), nos períodos em que a criança e/ou o adolescente permanece na cadeira. Esse exercício pode ser feito por até trinta minutos.
Estudo ensinou crianças a entrar em contato com novos objetos e situações para evitar crises
Há outra metodologia chamada de ‘treino de mando’, na qual orientações e procedimentos são verbalizados para autistas verbais ou não verbais, com o intuito de iniciar a aprendizagem de algo novo. São comportamentos verbais prováveis de serem emitidos, pois estão sob o controle de condições motivacionais, no caso, a fala de um adulto.
Um estudo científico de Bridget A. Taylor, professora de psicologia da Universidade de Rutgers, e Sandra L. Harris, professora emérita de Psicologia Clínica da mesma universidade descreve uma técnica de treino de mando em três crianças autistas.
Durante o estudo, as crianças foram ensinadas a fazer a pergunta “O que é isso?” diante de fotos e objetivos novos. A partir deste estímulo, elas aprenderam a fazer a pergunta de modo generalizado, ou seja, em outros ambientes, com outras pessoas.
Diferentes técnicas ajudam os autistas a saberem como se comportar e se adaptarem melhor aos diferentes meios por onde circulam
Na rotina, podemos introduzir essa técnica por meio de cartões, que devem ser mostrados todas as vezes em que se espera um determinado comportamento.
Por exemplo, toda vez que for necessário falar a palavra “obrigado” ou “olá”, os responsáveis mostram o cartão com a palavra por escrito e, na sequência, a verbalizam. Com a repetição, o autista irá associá-las e, toda vez que entrar em algum lugar, falará a palavra “olá” ou dirá “obrigado” quando receber uma gentileza.
Em uma situação estressante, com a presença de barulhos ou luminosidade excessiva, o autista terá meios de focar nos procedimentos ensinados anteriormente. Ele se concentrará em suas respostas sociais e saberá pedir para se retirar de determinado ambiente adverso, por exemplo.
Os treinos auxiliam o engajamento do autista em suas atividades e reduzem a sensação de aversão. Proporcionam, portanto, uma maior adaptação ao meio e reduzindo a frequência de crises.
Yasmine Martins
Psicóloga Clínica formada pelo Centro Universitário São Camilo, com especialização em Neuropsicologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), aprimoramento em Psicologia Hospitalar e mestrado em Ciências da Saúde Infantil no Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo (IAMSPE). É doutoranda em Saúde Baseada em Evidências na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Como mãe de um filho autista, eu sempre me preocupava com o recorrente comportamento de meltdowns em meu filho. Obrigada pelo artigo, agora entendi melhor sobre o que está acontecendo e como posso ajudá-lo de forma mais eficaz.
Excelente postagem! Eu não sabia que as pessoas com autismo poderiam ter um colapso nervoso também. Obrigada por ter abordado esse tema tão importante e educative. Eu sinto que eu Liandro é uma pessoa única e sempre havia achado que isso era impossível de entender. Agora eu entendi melhor e vou ser mais compreensiva com ele.