Quando cuidar também pesa: a sobrecarga silenciosa da rede de apoio no autismo

31/07/2025TEA no Dia a Dia1 Comentário

Quando cuidar também pesa: a sobrecarga silenciosa da rede de apoio no autismo

Ser pai e mãe é uma grande missão, com desafios e aprendizados. Para além da alegria de ver sua família crescendo, é fato que as prioridades mudam e a pressão aumenta. No caso de famílias com filhos atípicos, a rotina costuma demandar ainda mais atenção e cuidado. Frente a esse cenário, é preciso olhar para quem cuida. Ou, melhor: cuidar de quem cuida.

É inegável que uma rede de apoio para pais com filhos neurodivergentes é muito importante. Mas, mesmo aqueles que contam com apoio e suporte, sentem-se sobrecarregados. Quando pensamos em mães solo ou até mesmo em casais que não contam com essa rede, a realidade pode ser ainda mais desafiadora. De toda forma, o objetivo aqui é chamar atenção para esse cenário, comum em muitas famílias brasileiras, e fortalecer um debate propositivo sobre o tema. 

Familiares de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) são mais propensos  a  desenvolver  problemas  de  saúde  mental.  Achados do levantamento Retratos do Autismo no Brasil em 2023, realizado pela healthtech Genial Care, mostraram que, quando o assunto é cuidadores de pessoas com TEA, “ainda existe uma dificuldade acentuada (independentemente do estado civil, renda mensal e nível de escolaridade) para descansar e cuidar de si mesmos”.

Para a pesquisa, 2.247 brasileiros foram entrevistados para traçar um perfil das famílias que convivem com o TEA no país. Desse total, 1.723 declararam estar na posição de cuidadores de crianças com autismo; sendo que a maior parte desse número (62%) afirma que conta com ajuda para lidar com os desafios do Transtorno. Mas, pelo que aponta o estudo, o apoio recebido não é suficiente.  

Sobrecarga física, mental e emocional 

Para além das demandas comuns relacionadas à chegada de uma criança, o diagnóstico de autismo traz transformações que alteram a rotina de pais e/ou responsáveis. Em meio a tantos medos, tantas incertezas e tarefas sem fim, é comum que a sobrecarga ganhe cada vez mais espaço. Cansaço e falta de esperança podem tomar conta do dia a dia, impactando a saúde, a rotina doméstica e a vida familiar.

Na corrida contra o relógio, conciliando muitas demandas, vem o isolamento. Dessa forma, sentimentos como frustração e impotência caminham lado a lado com  tristeza e ansiedade, podendo gerar quadros depressivos. E, apesar da apatia, o mundo não para.

Além disso, cada família tem suas próprias particularidades, apesar de sabermos que, muitas vezes, as mulheres são as mais afetadas, por absorverem maior número de atividades, como consultas frequentes e cuidado mais próximo.

A imprevisibilidade também contribui para o aumento da tensão. Afinal, nem sempre é possível  prever crises ou comportamentos inesperados da criança ou do jovem com TEA. Segundo a Pesquisa da Genial Care, 32% dos entrevistados gostariam que as crianças conseguissem gerenciar momentos desafiadores sem crises.

Preocupação financeira 

Gerenciar as finanças é uma demanda recorrente na maioria das famílias atípicas, o que impacta diretamente na qualidade de vida e no acesso à saúde, ao autocuidado e ao lazer. Em casos mais extremos, necessidades essenciais ficam comprometidas, e mais do que nunca uma rede de apoio efetiva é fundamental.

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Pensi em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP (FIPE‑USP) revelou que famílias com membros autistas chegam a gastar até três vezes mais do que famílias típicas com o mesmo perfil socioeconômico em despesas com saúde, alimentação, transporte e educação. 

No levantamento feito pela Genial Care, 73% dos cuidadores disseram enfrentar dificuldades financeiras para arcar com os custos do tratamento; 79% afirmaram se sentir inseguros ao pensar no futuro a longo prazo da criança. 

Rede de apoio e informação confiável

Além de uma rede de apoio presente, ter acesso a informações confiáveis é muito importante para conhecer serviços e recursos que podem ajudar a suavizar essa rotina. As leis que tratam dos direitos de pessoas com TEA e seus familiares merecem ser amplamente conhecidas. Cuidar da saúde mental é fundamental para conseguir enfrentar os desafios da rotina. 

O primeiro passo é reconhecer que precisa de ajuda

Comportamentos que sinalizam a necessidade de atenção não podem ser ignorados ou normalizados. Entre eles estão: tristeza exacerbada, perda de interesse em atividades antes prazerosas; falta de higiene pessoal e pessimismo persistente. Despertar para a necessidade de cuidado é um passo importante. Isso pode vir da própria pessoa ou a partir do contato com alguém próximo. E, para além da percepção, é preciso buscar apoio.

É fato que é comum que a atenção esteja direcionada às necessidades da criança ou jovem com TEA, provocando um distanciamento de si e até mesmo de outros membros e amigos próximos, que poderiam ser pilares de uma rede de apoio importante. Assim, o recomendado é evitar o isolamento, dialogar e tecer relações confiáveis, sempre com escuta ativa. 

É fundamental que, em meio a essa jornada de cuidado diário e compromissos, os responsáveis por crianças e jovens com TEA consigam se organizar para encaixar na agenda um tempo para se exercitar, por exemplo. Afinal, ser gentil consigo mesmo é um caminho que nem sempre é fácil. Até mesmo boas práticas, como beber água, podem ser esquecidas.

Dar o primeiro passo é o mais importante, é o que nos impulsiona rumo à mudança. Dito isso, esta mensagem busca promover não apenas a conscientização da sociedade para que haja um olhar mais respeitoso e acolhedor em relação às pessoas com TEA e a criação de espaços adaptados para melhor receber essas famílias atípicas, mas também despertar em pais, mães e responsáveis por cuidar de filhos ou parentes com TEA, a importância de buscar apoio, de forma alinhada à realidade de cada um. 

Busque serviços próximos, converse com outras famílias que passam pela mesma situação, acesse informações úteis, que agregam valor no dia a dia. Sempre que possível, conte com um acompanhamento multidisciplinar que envolva toda a família e cuide-se!

Compartilhe este conteúdo e ajude-nos a levar essa mensagem adiante. 

 

Referências:

Canal Autismo. A sobrecarga dos pais de autistas. Disponível: https://www.canalautismo.com.br/artigos/a-sobrecarga-dos-pais-de-autistas/#google_vignette Acesso: 29 de julho de 2025. 

Crescer. Mesmo com rede de apoio, cuidadores de crianças com TEA se sentem sobrecarregados, aponta estudo. Disponível em: https://revistacrescer.globo.com/maes-e-pais/comportamento/noticia/2023/12/mesmo-com-rede-apoio-cuidadores-de-criancas-com-tea-se-sentem-sobrecarregados-aponta-estudo.ghtml Acesso: 29 de julho de 2025. 

Genial Care. Conheça os dados do estudo “Retratos do autismo no Brasil em 2023: um estudo Genial Care e Tismoo.me”.Disponível em: https://genialcare.com.br/blog/estudo-retratos-do-autismo-brasil-2023/#:~:text=responderam%20o%20estudo-,O%20estudo%20%E2%80%9CRetratos%20do%20autismo%20no%20Brasil%20em%202023%3A%20um,identificadas%20ao%20longo%20da%20jornada. Acesso: 29 de julho de 2025. 

Scielo. Sobrecarga familiar e crianças com transtornos do espectro do autismo: perspectiva dos cuidadores. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rcefac/a/3pfYytcbXMZxHhHFNFpwWHP/ Acesso: 29 de julho de 2025. 

 

1 Comentário

  1. Gostaria que vcs fizessem uma matéria sobre os professores que estão sobrecarregados, cuidando de uma demanda de autistas em sala de aula e sem o suporte necessário. Estamos adoecidos e ninguém vê.. especialmente nas escolas particulares, a cobrança é gigante e não recebemos salário que compense tanta sobrecarga. Cuidar de quem cuida, é urgente!

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