Práticas baseadas em evidência: o que são e como se relacionam com o TEA
Práticas baseadas em evidência: o que são e como se relacionam com o TEA
Nos últimos anos, falar em Práticas Baseadas em Evidências (PBE) tornou-se quase obrigatório quando discutimos saúde, educação e intervenções no desenvolvimento infantil. Mas o que está por trás desse conceito?
As PBEs nasceram de um movimento científico e social que buscava uma resposta para uma pergunta complexa: como garantir que as decisões clínicas sejam realmente as melhores para cada pessoa?
O movimento pela busca de mais segurança sobre informações médicas surgiu na década de 1970, a partir do trabalho do Dr. Archie Cochrane, médico do Reino Unido que estava inconformado com o fato de a prática médica e o cuidado em saúde, até então, não serem amparados por pesquisas científicas.
Suas críticas e propostas abriram caminho para o que, duas décadas depois, seria formalizado como Medicina Baseada em Evidências pelos professores Sackett e Guyatt da Universidade McMaster, no Canadá.
Essa proposta transformou profundamente a forma como se pensa o cuidado em saúde. Com o tempo, o movimento se expandiu para outras áreas, como psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, educação especial e políticas públicas, e passou a ser utilizado o termo “Práticas Baseadas em Evidências”.
O que são Práticas Baseadas em Evidências?
A proposta da RBC foi desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no final da década de 1970, após a Conferência Internacional sobre Atenção Primária à Saúde (Alma-Ata, 1978). Naquele momento, tornou-se evidente que países de baixa e média renda enfrentavam limitações que dificultavam o acesso de pessoas com deficiência a serviços especializados. A OMS propôs, então, a RBC como uma estratégia para aproximar a reabilitação da atenção primária à saúde, reconhecendo que fatores sociais, econômicos e ambientais influenciam diretamente a participação e as oportunidades dessas pessoas.
As Práticas Baseadas em Evidências (PBE) constituem um modelo de tomada de decisão clínica que integra, de maneira sistemática, as melhores evidências científicas disponíveis, a expertise profissional e as preferências, valores e contexto do paciente. Esse tripé garante que a intervenção escolhida não se apoie apenas em estudos, mas também na experiência clínica e nas necessidades reais da pessoa atendida. A partir desse paradigma, compreender a qualidade das evidências e os parâmetros que definem o impacto de uma intervenção torna-se essencial.
Nesse processo, os conceitos de eficácia, efetividade, eficiência e segurança desempenham papéis centrais.
A eficácia refere-se ao desempenho de uma intervenção em condições ideais e altamente controladas, como em ensaios clínicos randomizados – ambientes em que variáveis são rigidamente monitoradas. A efetividade, por outro lado, avalia o quanto esse mesmo tratamento mantém seus resultados em contextos reais, envolvendo a variabilidade natural dos pacientes, dos profissionais e das rotinas clínicas. A eficiência diz respeito à relação entre benefício clínico e uso de recursos, buscando identificar intervenções que ofereçam bons resultados com custos e esforços proporcionais e viáveis para os serviços de saúde. Já a segurança examina a probabilidade e a gravidade de possíveis efeitos adversos, garantindo que a intervenção apresente um risco mínimo e aceitável ao paciente.
Assim, a PBE não se limita a escolher o tratamento mais eficaz, mas exige uma análise crítica das evidências, avaliação clínica contínua e diálogo com o paciente. Ela possibilita que decisões sejam tomadas de forma mais ética, transparente e responsiva, promovendo cuidados mais qualificados e centrados na pessoa.
As Práticas Baseadas em Evidências ajudam a determinar um conjunto de procedimentos com um nível aceitável de pesquisa, assegurando que tal prática tem grandes chances de produzir resultados positivos para os pacientes. Porém, é importante levar em conta as singularidades de cada pessoa e entender que o que funcionou para uma pode não ter a mesma eficácia para outra. Práticas Baseadas em Evidências não são receitas prontas, e é um equívoco considerar que PBE é seguir um protocolo rígido, encaixando a criança em um manual.
Práticas baseadas em evidências no contexto do autismo
No campo do autismo, o conceito de PBE tem se tornado especialmente importante. Durante décadas, muitas abordagens de intervenção foram usadas sem respaldo consistente, algumas ineficazes, outras potencialmente prejudiciais. A adoção das PBEs tornou-se um ponto de virada para garantir intervenções éticas, seguras e centradas na criança e na família.
Na busca por informações sobre intervenção no autismo, é comum as famílias se depararem com diversos métodos, terapias e recomendações, o que gera muitas dúvidas e insegurança. No entanto, apenas uma parte das abordagens possui evidência científica robusta, comprovada por estudos de alta qualidade e ensaios clínicos randomizados.
Ter acesso a informações sobre PBE no autismo é essencial para as famílias, no momento em que buscam as melhores possibilidades de intervenção para o desenvolvimento de seus filhos. Também é de grande importância para os profissionais que buscam formação para atuar na área do autismo.
Diretrizes internacionais como NICE (Reino Unido), AAP (Academia Americana de Pediatria), APA (American Psychological Association) e NCAEP são lançadas periodicamente, analisando pesquisas publicadas, novos modelos de intervenção e revisões sistemáticas com metanálise.
Em 2020, foi publicado pela NCAEP nos Estados Unidos o guia Evidence-Based Practices for Children, Youth, and Young Adults with Autism (Práticas baseadas em evidências para crianças, jovens e adultos com autismo), que descreveu práticas baseadas em evidências sobre intervenções no contexto do autismo.
Foram identificadas 28 práticas baseadas em evidências para o TEA, que atingiram todos os critérios propostos pela revisão. Essas práticas abrangem áreas essenciais do desenvolvimento infantil, da educação e da vida adulta, incluindo estratégias para:
- Comunicação e linguagem, como o uso de Comunicação Alternativa e Aumentativa, modelagem de linguagem;
- Interação social, como grupos estruturados de brincadeira e intervenções mediadas por pares;
- Regulação emocional e comportamento, incluindo estratégias da ABA como reforçamento, análise funcional e intervenções cognitivas;
- Brincar e aprendizagem naturalística, como PRT, JASPER e Milieu Teaching;
- Participação ativa da família, uma das práticas com evidências mais fortes;
- Tecnologia assistiva e video modeling;
- Modelos abrangentes, como o Early Start Denver Model (ESDM) e o TEACCH.
Um ponto importante: essas práticas não são “métodos fechados”. Elas são princípios, estratégias e formas de organizar o ensino em casa, na escola, na terapia e na comunidade. Muitas delas podem inclusive ser potencializadas se combinadas, sempre respeitando o perfil, as necessidades e os interesses de cada criança ou jovem.
Essas são algumas das práticas recomendadas que podem apoiar a jornada de uma pessoa com TEA, sua família e cuidadores. Para saber mais, converse com um profissional especializado e veja o caminho mais adequado para cada caso. O acompanhamento de profissionais especializados, capacitados e comprometidos com PBE é fundamental para um diagnóstico e tratamento pautados por ética, segurança e amparo científico.
Por que isso importa no Brasil?
Em um país onde o acesso a serviços especializados ainda é desigual e muitas famílias ficam expostas a promessas sem base científica, conhecer as práticas baseadas em evidências é uma forma de proteger, orientar e fortalecer escolhas.
Para serviços de saúde, escolas e programas de formação, relatórios atualizados sobre PBEs no autismo funcionam como um guia para elevar a qualidade, estruturar políticas, organizar POPs e embasar decisões que serão tomadas diariamente com crianças e jovens com TEA e suas famílias.
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Neuroconecta. Saiba detalhes das práticas baseadas em evidências. Disponível em: https://neuroconecta.com.br/saiba-detalhes-das-praticas-baseadas-em-evidencias/ Acesso: 13 de novembro de 2025.
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Organization for Autism Research. Use of Evidence-based Practices. Disponível em: https://researchautism.org/oaracle-newsletter/use-of-evidence-based-practices/ Acesso: 13 de novembro de 2025.
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