Como evitar o capacitismo no dia a dia
Dicas para compreender melhor o autismo e viver um cotidiano de mais respeito aos autistas e suas famílias
Autistas e familiares relatam diariamente dificuldades que enfrentam ao lidar no dia a dia com pessoas que demonstram pouco entendimento sobre o autismo. Esses obstáculos são reflexos do capacitismo, o preconceito especificamente direcionado a pessoas com deficiência, grupo do qual fazem parte os autistas.
O capacitismo expressa a ideia de que as pessoas com deficiências (físicas ou mentais) são incapazes. Esse pensamento se baseia na premissa de que há um padrão corporal ideal – não apenas físico, mas também neurológico. Desta forma, quem não consegue se enquadrar neste suposto padrão, não pode participar das atividades sociais.
É necessário entender, portanto, que sim, pessoas com deficiência podem participar ativamente da sociedade, e que não, não é preciso estar dentro de um padrão para que isso aconteça, pois todos – pessoas típicas e com deficiência – são capazes dentro de suas limitações.
Selecionamos algumas atitudes que, incorporadas ao cotidiano, podem contribuir para que autistas, familiares, cuidadores, parceiros e amigos possam se sentir fortalecidos e acolhidos.
Entre as indicações, está o podcast Introvertendo, produzido e apresentado por autistas
– Consuma conteúdo produzido por autistas
Ouvir o que os autistas têm a dizer é essencial. São eles que podem explicar como é o dia a dia de quem vive com o transtorno, como percebem e como lidam com seu autismo, o que sentem quando se deparam com casos de preconceito, que outras dificuldades enfrentam e de que forma é possível apoiá-los. Em uma lista de autistas influenciadores, elencamos personalidades de destaque que inclusive já participaram deste blog, como colunistas ou entrevistados.
É o caso da ativista Luciana Viegas (@umamaepretaautistafalando), que aborda como racismo e capacitismo influenciam, por exemplo, a busca pelo diagnóstico. A fisiculturista Priscilla Peres conta nas redes que apesar de existir uma classificação de autismo considerada leve, a realidade deste diagnóstico está muito longe de ser fácil.
Outro exemplo é o primeiro e único podcast produzido e apresentado por autistas no Brasil. O Introvertendo discute a vivência dos autistas em uma multiplicidade de temas, que vão de sexualidade a manifestações políticas. Fazem parte da equipe o jornalista Tiago Abreu e o pesquisador Willian Chimura.
Livros escritos por autistas entram na lista, como “O Que Me Faz Pular”, de Naoki Higashida”
Há também uma série de livros escritos por autistas. Um dos autores mais populares é o japonês Naoki Higashida. Ele escreve suas obras indicando letra por letra em uma tábua alfabética. O maior sucesso fora do Japão é “O Que Me Faz Pular”, em que ele descreve sua vivência como autista não verbal. Uma personalidade histórica do autismo, Temple Grandin, relata sua vida em “Uma menina estranha – autobiografia de uma autista”. Publicamos uma lista com outros livros, inclusive com autores brasileiros, e você pode acessar aqui.
Livros e perfis nas redes sociais de mães e pais de autistas ampliam a conscientização
– Mães e pais de autistas também produzem conteúdo e vale a pena acompanhar
As mães e pais de autistas também contribuem para ampliar o olhar sobre o TEA (Transtorno do Espectro Autista). Eles costumam atuar no acolhimento e no esclarecimento de outros pais, caso de Mirza Lopes (https://www.instagram.com/maepeutadoacre/), que criou a comunidade Mãepeutas do Acre, e de Amabile Marchi, do @autismoaopedaletra.
Daiana Camilo divide a rotina de sua filha Manu em @mundo_da_manu_tea, Fatima De Kwant narra sua vida com o filho Edinho na Holanda e Marcos Mion populariza a discussão sobre autismo entre seus mais de 13 milhões de seguidores.
Além de ativos nas redes sociais, mães e pais de autistas também possuem uma produção literária intensa. Publicamos uma lista de publicações de pais de autistas e uma seleção de livros infantis, entre eles obras de mães de autistas..
Produção audiovisual sobre autismo e com protagonistas autistas se intensificou nos últimos anos
– Assista a filmes, desenhos, séries e especiais de TV protagonizados por autistas
O primeiro filme de sucesso mundial a retratar o autismo foi Rain Man, em 1988. Porém, por conta da falta de outras produções com outros perfis de autistas, o protagonista autista com síndrome de Savant se popularizou como um estereótipo. Nos últimos anos, a produção audiovisual com autistas como protagonistas se intensificou e trouxe mais pluralidade à representação do autismo na mídia.
As séries de TV The Good Doctor e Atypical estão entre os exemplos. The Good Doctor mostra a rotina do médico recém-formado Shaun Murphy, que tem autismo leve e síndrome de Savant, um quadro que na verdade é bem raro. Já Atypical conta a história de um adolescente com autismo leve descobrindo a sexualidade e conquistando autonomia. Há ainda uma série delicada e inspiradora sobre relacionamentos amorosos de pessoas com autismo, Amor no Espectro, que exibe a rotina de dois casais e sete solteiros com autismo em busca de um par.
O show Douglas, da humorista Hannah Gadsby, conta como ela se descobriu autista perto de completar 40 anos e como uma série de comportamentos passou a fazer sentido a partir do diagnóstico. Na produção infantil, o destaque é o desenho animado Pablo, que traz um garoto autista em situações desafiadoras, como uma ida ao supermercado. Ele recebe apoio de amigos animais imaginários que também têm autismo e ilustram a diversidade do espectro.
Saber o vocabulário básico do TEA também facilita entender a realidade do autista
– Procure compreender termos básicos relacionados ao autismo
Autistas, mães, pais, cuidadores e familiares lidam com um vocabulário específico para facilitar a compreensão do transtorno.
. Transtorno do Espectro Autista ou TEA
É o termo médico para designar o autismo. A pessoa autista é uma pessoa com TEA. Lembre-se de evitar dizer que uma pessoa é portadora de autismo, pois o autismo não é algo que ela possa deixar de portar, mas faz parte dela. É importante frisar que o autismo não é apenas um diagnóstico, mas também uma característica. Sem o autismo, a pessoa autista não existiria. Esta regra vale também para outras deficiências.
. Espectro
O autismo é considerado um espectro porque, em cada pessoa, o transtorno se manifesta de maneira específica, variando muito os sintomas e também a intensidade em que eles se apresentam. Cada autista é único. Uma frase, que parece óbvia, resume bem essa ideia foi dita pelo médico Stephen Shore: se você conhece um autista, você conhece apenas um autista.
Entender o que são comorbidades e o que quer dizer neurodiversidade contribui para compreender o TEA
. Comorbidades
O conceito de comorbidade nos ajuda a compreender o espectro. Cerca de 70% dos autistas apresentam uma ou mais comorbidades, que são condições associadas ao transtorno. A síndrome de Savant, o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e HIperatividade), o TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada), a ecolalia (repetição de falas fora de contexto) e os distúrbios do sono são todos comorbidades possíveis de pessoas com autismo.
. Neurodiversidade
Neurodiversidade é a variedade de composições neurológicas dos seres humanos. A palavra se refere a diferentes formas de existir a partir da formação cerebral e neurológica.
. Neurotípico x neuroatípico (ou neurodivergente)
Neurotípicos são pessoas que não são diagnosticadas com nenhum transtorno neurológico. Os neuroatípicos ou neurodivergentes são pessoas que lidam com transtornos, como é o caso dos autistas. Pessoas neurotípicas e neurodivergentes compõem a neurodiversidade humana.
Estereotipias ajudam o autista a se reorganizar ao ter que lidar com um excesso de estímulos
. Stims ou estereotipias
Stims ou estereotipias são movimentos repetitivos que ajudam a extravasar a sobrecarga de sensações e emoções. São ações repetitivas, como por exemplo um movimento pendular do corpo, para frente e para trás. Estas ações costumam acontecer quando o autista se sente bombardeado por estímulos e ajudam a pessoa a se reorganizar internamente e processar o que sente.
. Capacitismo
Capacitismo, como já explicamos, é o preconceito direcionado às pessoas com deficiência – entre elas, as autistas. Pessoas vítimas de capacitismo podem procurar a polícia. Esta é a orientação em casos graves, como o impedimento de matrícula em uma escola regular ou a chacota em público, como já ocorreu, por exemplo, em shows de humor no Brasil. As vítimas podem procurar uma Delegacia de Crimes contra as Pessoas com Deficiência para registrar um boletim de ocorrência ou recorrer a uma Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância. Na falta de delegacias especializadas, pode-se procurar uma delegacia comum, acionar o Ministério Público (MP) e também a Defensoria Pública.
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