Autismo em tirinhas
Quadrinhos ajudam a popularizar o transtorno de forma leve e divertida entre pessoas de todas as idades
A conscientização do autismo é essencial para ampliar a inclusão. Ter conhecimento das leis e direitos dos autistas fortalece mães, pais e cuidadores que acabaram de receber o diagnóstico e também as pessoas que fazem parte do seu convívio. Um dos principais desafios da comunidade autista e aliada é reduzir o estigma em torno dessas pessoas e seus familiares. Como o autismo não é uma deficiência visível, o comportamento de um autista gera estranhamento quando não se encaixa no que é considerado socialmente correto.
A produção cultural contribui, e muito, com a popularização de conceitos ligados ao autismo e o aumento da compreensão e da aceitação social dos autistas. Séries, filmes, livros autobiográficos, ficções e não ficções e livros infantis e adultos já foram listados em nosso blog como parte do rol de obras dedicadas ao transtorno. Hoje indicamos histórias em quadrinhos de autores autistas e não autistas para ampliar seu repertório.
Quadrinista mexicano relata impacto do diagnóstico na rotina em família
Fala, Maria
O premiado autor mexicano Bernardo Fernández, mais conhecido Bef, divide com seus leitores um relato autobiográfico sobre paternidade, amor e esperança. As páginas da HQ contam como ele e a então esposa Rebeca lidaram com o diagnóstico de autismo da filha, Maria. “É uma exposição pessoal que também deixa você em uma posição muito vulnerável”, diz o quadrinista.
Duas vozes convivem no livro, uma do pai e uma da filha, que é imaginada por ele, e que expressa como ela vê e se relaciona com o mundo.
O livro tem mais de 150 páginas, coloridas desde a capa em um pálido azul monocromático para definir o tom em que se transforma a vida da família com a chegada do diagnóstico. “Tudo está em azul monocromático pensando nas cores que estão relacionadas ao autismo e, também, porque achei que lhe dava um ar muito melancólico”, detalha Bef. No entanto, à medida que a história evolui, a coloração vai se transformando. A obra, publicada no Brasil pela Skript Editora, pode ser encontrada na Amazon por R$ 79.
André é o personagem que leva o autismo para o dia a dia da Turma da Mônica
Turma da Mônica
O personagem autista André faz parte da Turma da Mônica desde 2002. Ele foi criado após um estudo feito para AMA (Associação de Amigos do Autista) e um convite da Universidade de Harvard, ainda em 2001, para que o Instituto Mauricio de Sousa desenvolvesse um projeto de conscientização sobre o autismo. A iniciativa deu origem ao gibi “Um Amiguinho Diferente” e seis vinhetas de desenho animado que você pode conferir no site do instituto.
“Tomamos todo o cuidado do mundo quando resolvemos abordar temas mais complexos. Ouvimos sempre profissionais de comprovada credibilidade para não passar informação errada para os nossos leitores”, contou Mauricio de Sousa em entrevista à Veja Saúde sobre o personagem. “Quando criamos o André, por exemplo, pesquisamos muito sobre o transtorno do espectro autista (TEA), ouvimos vários especialistas e conhecemos crianças autistas. O TEA não é fácil de ser identificado”, detalha Mauricio. “Por essa razão, o tratamento pode ser tardio. Então, é preciso passar para os pais, professores e pessoas próximas a essas crianças a informação correta para ajudá-las a desenvolver todo o seu potencial.”
Obra retrata jovem que se descobre autista ao tentar entender melhor a origem de seus desconfortos
A Diferença Invisível
Esta é uma história em quadrinhos voltada ao público adulto. O livro conta a vida de Marguerite, uma jovem de 27 anos que aparenta ser uma pessoa típica. Mas ela se sente deslocada e todos os dias se esforça para parecer uma pessoa que se encaixa na rotina da cidade e do trabalho.
Quando se cansa do sentimento de inadequação, a jovem busca compreender porque se sente tão incomodada pelos ruídos que a cercam, com os diálogos incessantes dos colegas de trabalho e pela necessidade de manter um rotina rígida, sem mudanças de hábitos e sempre dentro de um ambiente cuidado como um casulo. É aí que ela se descobre autista e sua vida começa a mudar. Publicada no Brasil pelo Grupo Autêntica, a versão física da obra está disponível no site da editora por R$ 59,80. É possível também optar pela versão digital.
Desenhistas brasileiros relatam com leveza e bom humor as diferenças entre mentes típicas e atípicas
HQ do Lucas
O autista Lucas Quaresma foi mais longe do qualquer expectativa médica anunciada em sua infância após o diagnóstico. Hoje formado em design, ele é o criador das HQs do Lucas (https://www.hqsdolucas.com/), um projeto que alia a arte de criar quadrinhos com a conscientização sobre o autismo.
A arte de Lucas não só foi exposta, mas também distribuída entre passageiros do metrô e dos trens de São Paulo no Abril Azul deste ano. Lucas ilustrou também O “Guia para Leigos sobre TEA”, criado para que o público geral entenda as principais informações sobre o autismo e as particularidades de quem vive no espectro.
Autor de Humor Azul, Rodrigo Tramonte se define como anti herói na luta contra o capacitismo
Humor Azul
O cartunista brasileiro Rodrigo Tramonte, de 40 anos, se define com “um anti herói na luta contra o capacitismo” e é com bom humor que sua luta ganha força nas 97 páginas da HQ Humor Azul. Rodrigo foi diagnosticado com autismo já na idade adulta. Ele é formado artes plásticas, especialista em produção multimídia, escritor e palestrante, além de cartunista.
Na obra, ele apresenta, com bom humor, um lado lúdico da diferença de pensamento dos autistas em relação ao que é esperado por pessoas típicas, contando aventuras e desventuras do personagem Zé Azul e seus companheiros. Lançada em 2017, a obra está disponível nas versões digital e física. Assinantes do Kindle Unlimited podem baixar o livro de graça. Um link direto para a compra pelo PagSeguro está disponível aqui.
Nori e Eu
Duas formas de enxergar a história de uma família são contadas na HQ Nori e Eu. A obra é escrita por Sonia Ninomiya, a mãe, e Masanori Ninomiya, o Nori, seu filho, diagnosticado com autismo aos 4 anos. Nori já desenhava quando começou a falar, aos 12 anos. Em um vídeo, ele dá detalhes do processo de produção, que durou mais de um ano. A obra, de 92 páginas, lançada em 2019 pela WMF Martins Fontes, é vendida no site da editora por R$ 44,90.
Mulheres autistas dão toque de acidez às tirinhas com críticas divertidas a comportamentos típicos
Autie Word
A bióloga e designer Juliana Monique, diagnosticada com autismo aos 32 anos, se inspira em sucessos da internet como o do “Garoto da Pfizer” para criar as divertidades tirinhas do Autie Word, em que aborda detalhes do cotidiano dos autistas.
“Quando dizemos ao mundo que nós existimos, mostramos nossas dificuldades, nossas descobertas e batalhas diárias, estamos não só compartilhando nossas emoções, mas também denunciando um sistema falho em diagnosticar meninas e mulheres, estamos informando pais, mães e outras mulheres sobre o autismo e que ele deve ser levado a sério”, conta Juliana em entrevista ao site Mina de HQ.
No Autie Word, Juliana detalha conceitos ligados ao transtorno, hiperfoco, hipersensbilidade e ressaca social, dividindo parte de sua rotina e dos desafios de explicá-la a pessoas típicas. Um deles é fazer as pessoas compreenderem que, após o diagnóstico, parou de mascarar as manifestações do transtorno, mas ouve em tom de reclamação que se tornou “mais autista”. Mascarar o transtorno, no entanto, é algo que prejudica o autorreconhecimento, a conquista do diagnóstico, e gera intenso gasto de energia, podendo acarretar crises graves nos autistas.
Tirinhas da Sara
A psicóloga Aline Provensi dá explicações detalhadas sobre o transtorno a partir de sua experiência profissional como especialista em TEA. Ela consegue aliar conhecimento técnico à vivência enquanto autista de forma lúdica e esclarecedora nas Tirinhas da Sara, enquanto faz críticas ácidas e bem humoradas a falas recheadas de ignorância e preconceito sobre o transtorno.
A mais recente faz um contraponto a uma declaração recente de um ministro de que alunos com deficiência atrapalhariam alunos típicos em sala de aula. “Realmente, Stephen Hawking, Frida Kahlo, Temple Grandin atrapalham demais nossa aprendizagem, né?” rebate uma personagem de Aline. “Quanto mais a gente desmistificar e simplificar, mais todo mundo vai saber o que é, como agir, e assim vamos poder transformar a sociedade”, disse a quadrinista à Gazeta do Povo .
Ter acesso à produção cultural sobre autismo contribui para diminuir o capacitismo no dia a dia
Entrar em contato com obras produzidas por autistas e sobre autismo é uma das maneiras de reduzir o capacitismo, o preconceito praticado especificamente contra pessoas com deficiência. Entre as dicas, está ainda seguir influenciadores da comunidade, tanto pais e mães, mas especialmente os próprios autistas que têm muito a contar sobre suas vivências e a ensinar pessoas típicas a serem mais acolhedoras e inclusivas.
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