As dificuldades de levar a criança autista a uma consulta médica
Primeiro desafio mais comum das famílias é lidar com a quebra de rotina; veja dicas
Muitas mães de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) se queixam sobre o momento de ir a uma consulta com o pediatra. Aqui neste texto vamos expor algumas preocupações e tentar esclarecê-las.
A primeira dificuldade já surge em casa, quando é necessário sair do dia a dia habitual para ir ao médico.
Esse momento costuma ser difícil porque é necessário mudar a rotina da criança para ir a uma consulta. Sabemos que a rotina é algo muito importante para os autistas e mudá-la drasticamente causa sofrimento.
Deixar a criança a par de tudo o que vai acontecer é muito importante
Para tentar aliviar um pouco essa tensão, podemos encaixar a consulta em algum momento que mude o menos possível a rotina .
Por exemplo: se ir à escola todos os dias faz parte da rotina, vamos encaixar a consulta depois da aula para que a criança não precise faltar. É importante contar a ela o que vai acontecer e deixá-la ciente, não apenas tirá-la de casa, o que a deixaria assustada.
Depois do translado, temos a dificuldade da sala de espera. Dê preferência a consultas com hora marcada. Dessa forma, a espera será a menor possível.
É difícil para criança autista ficar parada em meio a multidões e sons diversificados. Por conta da sensibilidade aguçada e da dificuldade de ter noção de temporalidade, a espera na sala cheia pode ser agoniante.
Autistas têm direito à fila de prioridades estabelecido pela lei brasileira
Já se a consulta for via pronto atendimento, geralmente em casos de doenças mais agudas, como emergências ou resfriados e diarreias, o ideal seria utilizar a fila de prioridade, diminuindo assim o tempo de espera e a exposição à lotação da sala de espera.
A Lei 12.764 de 27/12/2012 determina no artigo 1º, § 2º “A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.”
A Lei 10.048 de 08/11/2000 garante no artigo 1º “As pessoas com deficiência, os idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, as gestantes, as lactantes, as pessoas com crianças de colo e os obesos terão atendimento prioritário, nos termos desta Lei.”
Dietas e horários de prescrições podem ser mais difíceis de serem cumpridos por crianças autistas
Além disso, é possível utilizar fones antirruído para diminuir a hipersensibilidade aos barulhos diversos do local ou carregar objetos que cativem a criança para acalmá-la nesses momentos.
Durante o atendimento, em consultas agendadas , onde podemos escolher o profissional que irá nos atender, é importante procurar aqueles que conheçam o transtorno e tenham ideia de como lidar com as particularidades dos autistas. Isso é importante para conseguirmos seguir com um tratamento correto.
Por exemplo: algumas apresentações de medicações são muito difíceis de serem realizadas e alguns horários são muito incômodos. Portanto, serão necessárias adaptações na prescrição deste paciente. Além disso, solicitar certas dietas para pacientes com seletividade alimentar também seria de improvável realização.
É importante que o médico explique antes, em detalhes, à criança todo procedimento que será realizado
Durante o atendimento em consultas de pronto atendimento, que costumam ser mais rápidas e para resolver queixas pontuais, dificilmente conseguimos escolher o profissional a dedo.
Nessa consulta, é importante que o profissional seja um bom ouvinte, calmo e transmita informações de forma clara. Aqui, é importante novamente explicar para criança tudo o que está acontecendo, antes de simplesmente tocar na criança para examiná-la.
Quando o profissional explica, por exemplo, “vou colocar esse estetoscópio nas suas costas para escutar o pulmão. Só vai encostar, tá bom? Isso não dói”. Essa simples explicação já facilita o atendimento e acalma a criança.
Agulhas são ainda mais temidas por crianças autistas do que por crianças típicas
Quando for necessário o uso de medicações endovenosas ou intramusculares, é preciso ter em conta que crianças autistas costumam ter uma dificuldade ainda maior em lidar com agulhas do que as crianças típicas. Converse com o médico sobre essa necessidade, veja se a medicação pode ser realizada de outra forma.
Tire todas as suas dúvidas durante a consulta e exponha as dificuldades da criança. Assim, pensando juntos, é mais fácil chegar a tratamentos que sejam possíveis de serem seguidos pela criança. E não esqueça de manter as consultas de rotina com o pediatra em dia!
Bárbara Bertaglia
Médica residente na pediatria da Santa Casa de São Paulo, pesquisadora na área de Transtorno do Espectro Autista e membro da equipe Autismo e Realidade desde 2019
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