Autistas tomam remédio?

18/11/2022Tratamentos0 Comentários

Medicação usada por pessoas com TEA é focada no tratamento de suas comorbidades; entenda

Uma dúvida comum que surge em quem começa a estudar o autismo é sobre medicações. Então, existe algum remédio que trate o autismo?

A resposta é direta: não. Não existe medicação para tratamento do autismo. Logo após essa resposta, a próxima pergunta geralmente é “então porque muitos autistas tomam remédio?”

A medicação utilizada para pessoas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é para as comorbidades que podem estar associadas.

Cerca de 70% dos autistas lidam com ao menos uma comorbidade

Comorbidade é um termo médico que descreve outras condições que podem se manifestar junto ao TEA. Elas estão presentes em cerca de 70% dos indivíduos com TEA, sendo que 48% deles podem ter mais de uma comorbidade. Estas condições associadas podem ser psiquiátricas, como TDAH, ou médicas, como distúrbios do sono.

Então, por exemplo, pessoas com TEA e agressividade podem tomar medicação, pessoas com TEA e transtornos do sono podem tomar medicação, pessoas com TEA e ansiedade ou TDAH podem tomar medicação, e assim por diante. Sempre dependendo da avaliação médica prévia.

Autismo depende de acompanhamento multidisciplinar

Pronto, entendemos essa parte. Então a segunda pergunta que vem logo após é: “Qual o tratamento para autismo?”. O tratamento é, basicamente, a estimulação e adaptação comportamental. O acompanhamento é feito por profissionais de diversas áreas, como psicologia, terapia ocupacional, nutrição, enfermagem, educação física etc.

Dessa forma, o tratamento visa o desenvolvimento do indivíduo com autismo: adaptar dietas favoráveis (mesmo em meio a seletividade alimentar), exercícios físicos, horários e estimular a socialização, atividades, entre outros pontos.

E existem pessoas com autismo que iniciam o uso de medicações e diminuem a terapia comportamental?

Estudo com crianças autistas de 2 a 5 anos avaliou a relação entre medicação e terapia comportamental

Publicado no The Journal of Pediatrics em 2021, o artigo científico com o título traduzido de “Muitas crianças com autismo que usam medicação psicotrópica não recebem terapia comportamental: um estudo de caso-controle em vários locais” mostra que sim.
O estudo pretendia explorar quantas crianças em idade pré-escolar com TEA usaram medicação psicotrópica e quantas crianças que usaram medicação psicotrópica receberam ou não receberam terapia comportamental.

Para isso, ocorreu a participação de crianças de 2 a 5 anos de idade inscritas de 2012 a 2016 em um estudo de caso-controle multicêntrico, projetado para investigar o desenvolvimento e os fatores de risco do TEA.

Medicação é importante, mas não o único tratamento para crianças autistas

As crianças com uma triagem de TEA positiva ou diagnóstico no momento da inscrição foram solicitadas a concluir uma avaliação abrangente para determinar o status de TEA e o nível de desenvolvimento.

Os cuidadores preencheram um questionário de ‘Serviços e Tratamentos’ e vários outros para determinar o uso de medicação psicotrópica pela criança, o recebimento de terapia comportamental e a presença de sintomas concomitantes.

Ao final do estudo, havia 763 crianças classificadas com TEA que tiveram dados coletados no Questionário de Serviços e Tratamentos. Dessas, 8,1% usavam medicação psicotrópica para tratar sintomas comportamentais e 3,7% tinham ≤ 3 anos de idade quando a medicação foi iniciada. Mais da metade (59,7%) dos que usaram medicação psicotrópica nunca recebeu terapia comportamental.

Dessa forma, notamos que muitas crianças em idade pré-escolar com TEA que usam medicação psicotrópica não recebem terapia comportamental. Vimos no início do texto que o acompanhamento psicológico é um dos meios de desenvolver a pessoa com autismo e não realizar este tratamento pode prejudicar o prognóstico da pessoa. A medicação pode ser importante para lidar com as comorbidades, conforme indicação médica, mas não deve ser considerada como um tratamento único.

Bárbara Bertaglia

Bárbara Bertaglia

Médica residente na pediatria da Santa Casa de São Paulo, pesquisadora na área de Transtorno do Espectro Autista e membro da equipe Autismo e Realidade desde 2019

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