Vocabulário básico do autismo: neurodiverso x neurodivergente

3/03/2023TEA no Dia a Dia0 Comentários

Compreender o que quer dizer cada palavra ligada ao mundo autista ajuda a combater a exclusão; entenda os significados

Há uma série de palavras que fazem parte das discussões sobre autismo e é importante saber usá-las corretamente.

Uma das palavras que já era uma velha conhecida da comunidade autista muito antes de ser popularizada pela pandemia de covid-19 é o termo comorbidade, que significa algo que surge de forma associada. No caso do autismo, é bastante comum, por exemplo, que ele esteja associado a distúrbios do sono, depressão ou TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), por exemplo.

Há outras duas palavras que são relativamente novas no debate sobre autismo: neurodiverso e neurodivergente.

Todas as pessoas são neurodiversas, sejam elas típicas ou atípicas

O termo neurodiverso vem de neurodiversidade, registrado pela primeira vez em 1998 pela socióloga australiana Judy Singer, que se descobriu autista na idade adulta.

Neurodiversidade significa a variedade de composições neurológicas humanas. Os seres humanos são neurodiversos, pois não há duas mentes iguais umas às outras.

Para simplificar, Judy Singer costuma comparar a neurodiversidade à biodiversidade, que é o conjunto de seres vivos que compõem a natureza. A biodiversidade inclui, por exemplo, seres tão diferentes quanto margaridas, moscas e jacarandás.

O termo neurodiverso não se refere a apenas um indivíduo, mas a um grupo deles. Ninguém diz, por exemplo, que um cachorro é biodiverso. Assim como não faz sentido dizer que uma pessoa típica é neurodiversa. Mas podemos pensar que os seres humanos, enquanto um extenso grupo de pessoas, são neurodiversos. Ou que a classe de uma escola é neurodiversa.

Neurodivergência faz menção a um indivíduo, enquanto neurodiversidade se refere a um grupo de pessoas

Em uma publicação da ativista australiana Sonny Jane Wise, ela exemplifica o que é um grupo neurodiverso. Pode ser um grupo que reúne, por exemplo, uma pessoa com autismo, uma com TDAH e uma com TOC. Da mesma forma, é também um grupo neurodiverso aquele que reúne uma pessoa típica, um autista, uma com TOC.

Quando falamos de cada indivíduo separadamente, explica Sonny, podemos usar o termo neurodivergência. Uma pessoa sozinha não é, por si só, neurodiversa, mas ela pode ser neurodivergente.

Uma pessoa neurodivergente pode ter, por exemplo, autismo ou epilepsia ou síndrome de Down, TOC, bipolaridade ou mesmo mais de uma neurodivergência – neste caso, devemos dizer que ela tem múltiplas neurodivergências.

Exemplos simples nos ajudam a compreender melhor a neurodiversidade

“Precisamos usar neurodiverso e neurodivergente corretamente porque quando neurodiverso ou diverso é usado para se referir a um indivíduo que é diferente da maioria, reforça a ideia de que a maioria é o padrão”, afirma Sonny.

A pesquisadora Sue Fletcher-Watson, do departamento de pesquisa em desenvolvimento do autismo (Dart) da Universidade de Edimburgo, também nos ajuda a entender melhor o conceito.

“A diversidade é uma propriedade dos grupos. Requer variabilidade entre as coisas. Você só tem uma gama diversificada de ervas em seu armário se tiver muitas ervas diferentes. O coentro não é ‘diverso’ enquanto a salsa é ‘típica’. ‘Diverso’ não é sinônimo de ‘raro’. Em vez disso, coentro, manjericão, tomilho e salsa compõem um grupo diversificado de ervas.”

Termos criados por mulheres neurodivergentes ajudam a romper estigma

Em vez de chamarmos uma única pessoa de neurodiversa, devemos descrevê-la como neurodivergente.

Entre os exemplos de pessoas neurodivergentes estão aquelas com com deficiências psiquiátricas (depressão, ansiedade, esquizofrenia, bipolar), pessoas com deficiências de desenvolvimento ou intelectuais (autismo, síndrome de Down ou outros tipos de deficiência intelectual) e pessoas com deficiências de aprendizagem, como dislexia.

O termo neurodivergente foi criado no ano 2000 pela ativista com divergências múltiplas Kassiane Asasumasu, uma norte-americana de origem asiática que é instrutora de ginástica, arqueira amadora e fundadora da ONG Foundations for Divergent Minds, que atua no desenvolvimento de pessoas neurodivergentes. Em um blog em 2018, ela assinava como Neurodivergent K (veja aqui http://timetolisten.blogspot.com/).

Se considerarmos, por exemplo, uma família com uma pessoa neurotípica, uma pessoa epiléptica e um autista, podemos descrevê-la como uma família neurodiversa com dois membros neurodivergentes.

Neurodivergente não é um termo médico, mas uma palavra que gera identidade

“Neurodivergente, às vezes abreviado como ND, significa ter uma mente que funciona de maneiras que divergem significativamente dos padrões sociais dominantes do que se considera como ‘normalidade’”, define o site da Stimpunks Foundation, uma ONG de suporte à aprendizagem de pessoas com deficiências (veja aqui https://stimpunks.org/glossary/neurodivergent/) .

Um dos motivos pelos quais é importante usar corretamente os dois termos é que ambos foram criados por pessoas neurodivergentes e não por pessoas típicas. Não foram palavras impostas a este grupo.

É importante que uma comunidade possa, ela mesma, se definir, pois isso acaba por criar uma identificação e não um estigma, ampliando sua inclusão social. “Neurodivergente não é um termo médico ou clínico, é uma identidade”, reforça Sonny Jane Wise.

Escrito por Clarisse Sá, Teia.Work

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