Autismo em vídeos
Série de vídeos da FJLES explica o que é o TEA, fala sobre inclusão e ensina brincadeiras para estimular as crianças em casa
“Receber um diagnóstico de autismo é desestabilizador para qualquer família”, conta Mariana Azevedo, mãe dos autistas Gabi e Dani. A história de Mariana e outras mães e pais de crianças e adolescentes autistas é contada em um dos vídeos produzidos pela Fundação José Luiz Egydio Setúbal (FJLES).
“O que é o Transtorno do Espectro Autista, TEA” é o primeiro dos 11 vídeos produzidos pela fundação, que é a mantenedora do Autismo e Realidade. Confira aqui a playlist completa.
É muito importante que pais e mães de autistas possam se identificar com outras histórias de quem se deparou com a mesma realidade. Ainda hoje, a intensa idealização em torno da chegada de um bebê pode provocar um choque quando se descobre que se trata de uma pessoa atípica. “Foi um momento traumático na nossa vida, a gente não tinha noção do que poderia vir”, conta Felipe Azevedo, marido de Mariana.
Falta de inclusão faz com as pessoas tenham apenas estereótipos como referência, mas a realidade do autismo é múltipla
Além disso, a falta de políticas de inclusão faz com que o autismo seja percebido não por meio de sua realidade de múltiplas formas de manifestação, mas restrito a estereótipos. “Na época, a gente não tinha contato com nenhuma outra família que tinha criança autista então a gente tinha aquele estereótipo do autismo muito grave”, conta Mariana.
O parco sistema de inclusão – que é visto não só no Brasil, mas em todo o mundo – traz uma profunda preocupação sobre o futuro das crianças. “A ideia de que seu filho tem um transtorno de desenvolvimento, que você não sabe como vai ser lá na frente traz muita angústia, é difícil”, diz a promotora de Justiça Sandra Massud, mãe de Stephano.
O quadrinista Bef conta um pouco dessa angústia sobre o futuro em seu livro “Fala, Maria”, em que fala justamente do processo de assimilação do diagnóstico da filha. Ele conta que vive um dia de cada vez. “Há esperança infinita e sim, essa esperança também vale para nós”, disse o autor em entrevista ao Autismo e Realidade, como mensagem aos leitores brasileiros.
Quanto mais cedo o diagnóstico e a estimulação das crianças autistas, maiores as chances de desenvolvimento
Após receber o diagnóstico, é hora de agir para garantir o desenvolvimento da criança. “Comecei a socializar imediatamente, do jeito que o médico mandou. Significava tirar de casa, leva pra tudo quanto é lugar”, conta Sandra.
O tempo é precioso para quem cuida de crianças autistas. Quando mais cedo o diagnóstico e a estimulação acontecem, maiores as chances de desenvolvimento. “Nós matriculamos os meninos na escola e já corremos atrás do tratamento para fazer as terapias indicadas”, diz Mariana.
“A pior coisa que se pode fazer é lutar contra o diagnóstico”, diz Felipe. A gente buscou tudo quanto é possível de tratamento, são tratamentos caros, que nem toda família tem condição de buscar.”
Abandono paterno é frequente no Brasil, mas união do casal fortalece a busca por cuidados para a criança autista
Uma das grandes questões com as quais lidam as famílias de autistas é o abandono paterno. Cerca de 12 milhões de mães brasileiras – típicas e atípicas – cuidam sozinhas de suas famílias, segundo dados mais recentes do IBGE, de 2020.
“A gente precisa entender que pai participativo é exceção e não a regra”, afirmou em entrevista ao Autismo e Realidade o designer, ativista autista e pai de autista Tio Faso. “Aliás, o termo ‘pai participativo’ nem deveria existir, afinal é apenas um pai fazendo o que todo pai deveria fazer – nada de confete por isso.”
No vídeo da fundação, o pai de Kelvin, Alessandro de Souza, afirma: “Com os pais unidos, é possível uma vida melhor, mais inclusiva”.
“Minha vida mudou depois da sua vida”, declara Sandra Massud ao filho Stephano, autista
“Dá pra ser feliz com o autismo”, conta Mariana. Alessandro conta que antes do filho nascer tinha planos e expectativas e, após o diagnóstico, passou a contar com outros planos e expectativas. Em um recado para o filho, Sandra declara: “Você mudou com certeza a minha vida como mulher, como mãe, como irmã, como tia, a minha vida é outra depois da sua vida”.
Adaptar-se à nova realidade e entender as necessidades e limitações da criança autista é essencial para que ela possa se desenvolver de forma plena e feliz. Alessandro conta um diálogo com o filho. “‘E aí Kelvin, o que você quer ser quando crescer?’. Ele tinha 3 anos e ele respondeu. ‘Oh, pai, eu quero ser feliz”.
Mães e pais precisam lidar com rótulo de “guerreiros” e veem os filhos serem chamados de “anjo azul”
Um outro vídeo da série, intitulado “Como são as famílias das crianças autistas”, aborda não só a reação dos pais ao diagnóstico, mas também das pessoas com quem a família convive. Entre as reações estão a de tratar o autista como anjo e a outra é de pensar nos pais como guerreiros.
Em nenhum dos casos, as pessoas estão sendo tratadas de forma igualitária. Autistas, seus familiares e cuidadores devem ser tratados como iguais, não como seres superiores ou inferiores a ninguém. Estas supostas expressões elogiosas são, na verdade, um sinal implícito de capacitismo.
“Nossa, vocês são abençoados, um anjinho azul. Eu detesto”, desabafa a mãe de Dimitri. “Tem outro que é pior, quepara toda a criança especial, Deus manda uma mãe especial. Gente, é terrível isso! Não é nada disso”, conta a mãe de Dimitri.
É comum que escolas neguem matrículas para crianças com autismo, mas há canais de denúncia
Além dos relatos de pais e mães em seu contato com o diagnóstico, a playlist composta por 11 vídeos fala também sobre inclusão. “Lugar de Autista é em Todo Lugar” é um deles. “Nós autistas somos capazes de muitas conquistas”, diz um dos autistas que participam do vídeo.
A inclusão escolar e a inclusão no mercado de trabalho, que ainda são escassas no Brasil, também são tema de episódios. Lidar com a negação de matrículas faz parte das dificuldades enfrentadas por mães, pais e cuidadores de autistas.
A musicista Adriana Godoy, mãe de Victor, teve de lidar com oito negativas de escolas para seu filho. Ela conta que se sentiu impactada ao visitar uma escola e ouvir que se quisesse poderia matricular o filho lá, mas que um outro garoto autista que já havia estudado lá passou por um episódio de bullying em que foi deixado pelado pelos colegas. “Se você quiser trazer ele pra cá, você traz. Mas a gente não garante nada”, disse a funcionária da escola, segundo Adriana.
Rejeitar a matrícula de crianças autistas é crime. A punição prevista para os gestores das instituições é de indenização de três a 20 salários mínimos. Em caso de reincidência, há risco de perda do cargo. A escola também não pode vincular a matrícula ou rematrícula à apresentação de um laudo. Confira aqui orientações para lidar com estes casos.
Inclusão escolar contribui para ampliar a inclusão fora dos portões da escola
A inclusão requer serviços especializados, apoios diferenciados e atendimento individualizado, além do contato com outras pessoas da mesma faixa etária. “É importante esse movimento de inclusão porque a partir do convívio escolar você cria uma cultura de convivência, uma cultura de acesso a direitos”, conta Rosemary Hilário, professora de atendimento educacional especializado.
“As relações humanas são aprendidas, então quando a gente aprende a estabelecer essas relações, a gente leva essas relações da escola pra fora. E aí, obviamente tem impacto em toda sociedade. O fato da gente não saber como a gente cumprimenta uma pessoa cega não é falta de informação, é falta de convivência”, diz Liliane Garcez, gerente de programas do Instituto Rodrigo Mendes.
Brinque em casa com seu filho com brinquedos feitos por vocês mesmos
A casa deve ser o refúgio para o autista, o lugar onde a criança se sente à vontade para se manifestar como ela é e ser entendida a partir da convivência familiar. É possível tornar tudo mais leve construindo as próprias brincadeiras.
Em três vídeos da série Brincando com Autistas, a especialista em Child Life Sandra Mutarelli e a psicóloga do Instituto PENSI Yasmine Martins ensinam a criar brinquedos dentro de casa para as crianças se divertirem enquanto se desenvolvem. Passa Bolinhas, Passa Cordão e Encanamento Mágico auxiliam o desenvolvimento psicomotor. Caixinha da Matemática, Bingo Educativo e Tabuleiro de Cores ampliam o raciocínio lógico. Tem ainda a Tábua das Texturas, a Garrafa Mágica, o Chocalho, a Tábua das Cores e o fantoche.
Todos os vídeos estão disponíveis no canal Saúde na Infância. A Fundação José Luiz Egydio Setúbal é uma Instituição sem fins lucrativos que nasceu tendo como missão trabalhar pela saúde infantil em diversas frentes, entendendo a saúde não como uma oposição à doença, mas como bem-estar da pessoa na dimensão biopsicossocial.
Escrito por Clarice Sá, Teia.Work
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