Personagens autistas

10/05/2023TEA no Dia a Dia0 Comentários

Representatividade vem aumentando e mostrando a diversidade do espectro; estereótipo ligado a Rain Man vem, enfim, perdendo força

Assistir a filmes e episódios de TV que mostram autistas é mais eficiente para incentivar a inclusão e reduzir o estigma sobre o transtorno, como revela um estudo já destrinchado neste blog. Além disso, a forma de representação do autismo na mídia influencia diretamente o estereótipo sobre transtorno. Por muitos anos, o personagem Raymond Babbit, do filme Rain Man, definiu a imagem do que é ser autista. Mas ele está longe de representar a realidade tão diversa do TEA.

Como o autismo é um espectro, é muito difícil que apenas um personagem seja capaz de representar todas as pessoas com o transtorno. Babbit, por exemplo, é um homem branco autista com síndrome de Savant . A estimativa é de que um a cada dez autistas tenham a síndrome. Temos, portanto, uma comunidade nove vezes maior que não tem savantismo.

Autistas com síndrome de Savant podem associar habilidades excepcionais de cálculo, memória e música a déficits de interação socioemocional e linguagem. Foi esse o estereótipo que predominou em torno do autismo por muitos anos. Rain Man foi lançado em 1988, ganhou seis estatuetas do Oscar e permanece vivo ainda hoje como referência do que é ser autista. Há autistas como Babbit? Sim. Mas o espectro não se resume a pessoas como ele e novos personagens vem refletindo esta realidade.

Falar na variedade de perfis de autismo hoje é não só destrinchar o diagnóstico, mas características socioeconômicas

Há muito mais no autismo além da diversidade do diagnóstico em si – que pode incluir diferentes síndromes, comorbidades, estereotipias e alterações sensoriais, por exemplo. Os autistas também têm diferentes raças, identidades de gênero, idades, classes sociais e sexualidades.

Pouco ainda se fala na mídia sobre autismo na terceira idade e as intersecções entre autismo e racismo. Pessoas negras com autismo ainda são sub-representadas. O que podemos ver hoje são autistas fazendo parte do mercado de trabalho, tentando iniciar a vida sexual, criar laços de amizade, gerenciar o próprio dinheiro, lidar com o envelhecimento e a morte dos pais e com algumas das características que dificultam sua inclusão – como agorafobia, por exemplo.

Confira alguns dos personagens que representam autismo hoje.

Entre os personagens infantis, estão integrantes da Turma da Mônica e Vila Sésamo

André, da Turma da Mônica. A criação do personagem foi proposta ao Instituto Mauricio de Sousa pela Universidades de Harvard em 2001 para ampliar a conscientização sobre o autismo. A primeira revistinha em que ele aparece, Um Amiguinho Diferente, é de 2003. André é um menino autista que interage pouco com as pessoas, mas ainda assim acaba fazendo parte da travessuras de Cebolinha contra a Mônica.

Júlia, da Vila Sésamo. A primeira personagem autista da Vila Sésamo estreou em 2017 na TV. Sucesso no Brasil na década de 1970, a série é exibida hoje nos canais PBS e HBO. É possível também acompanhar episódios animados no canal da vila no YouTube, como a apresentação de Júlia.

Pablo tem amigos autistas imaginários e Bruno é um vagão de trem com uma perspectiva única

Pablo e seus amigos. O desenho animado Pablo conta histórias de um menino autista que tem a ajuda de amigos autistas imaginários para lidar com as dificuldades em sua rotina. Os amigos são animais que servem para ilustrar a diversidade de manifestações do autismo, como a lhama Lhama, que tem ecolalia, e o passarinho Wren, que tem como estereotipia o bater de asas.

Bruno, de Thomas e seus Amigos. Criado em 1947, o seriado conta aventuras de trens que vivem na ilha imaginária de Sodor, e ganhou um integrante autista em 2022. Bruno, o vagão de frenagem, fica no fundo dos trens. Por isso, tem uma perspectiva totalmente diferente de todos os outros. Para a criação do personagem, a Mattel Television contou com uma parceria com duas organizações de defesa dos autistas (Autistic Self Advocacy Network e a Easterseals Southern California) e dois escritores e ativistas autistas, Daniel Share-Strom e Aaron Likens. Ele é dublado por Chuck Smith, um ator autista.

Curtas da Disney retratam relação entre pai e filho e cumplicidade entre uma autista não verbal e um garoto típico

O bebê de Float. O curta-metragem da Disney aborda a aceitação de um filho autista pelo pai típico. Criada por um pai de autista, a obra dura pouco mais de cinco minutos, e está disponível para o público brasileiro desde 2020 na plataforma de streaming da Disney. A trama é inspirada na história do próprio diretor, Bobby Rubio, que entrou em depressão ao descobrir o diagnóstico do, Alex, quando o menino tinha 2 anos e meio.

Renee, de Fitas. O curta de cerca de cinco minutos mostra a cumplicidade que se cria em um breve passeio de canoa entre Renee, uma menina não verbal, e Marcus, um garoto típico. Lançada em 2020, a animação em 3D também está disponível para o público brasileiro no canal de streaming da Disney.

Auts, de Eu Sou Auts. A série de animação que também virou curta-metragem mostra as aventuras de Auts, um menino autista de 6 anos, e seus amigos. A inspiração vem de Arthur, o filho autista de Renato e Fernanda Barreto, criadores do desenho, disponível no YouTube e com perfis no Instagram e no Facebook.

Everything is Gonna Be Ok traz novos olhares sobre sexualidade e, assim como As We See It, aposta em personagens adultos

Matilda, Drea e Nicholas, de Everything is Gonna Be Ok. A série aborda questões sobre sexualidade. Matilda, por exemplo, é uma jovem autista bissexual que namora Drea, uma mulher autista assexuada. Nicholas, irmão mais velho que assume a guarda de Matilda e da irmã típica Geneviéve, se descobre autista ao longo da série e traz a discussão sobre diagnóstico tardio. A série representa também um movimento para evitar a cripface, termo usado para a escalação de atores típicos no papel de autistas. Os atores que vivem Matilda, Drea e Nicholas estão no espectro. A série está disponível na plataforma Hulu.

Jack, Violet e Harrison, de As We See It. Os personagens são autistas que se conhecem desde a infância e dividem o mesmo apartamento. Os três lutam para conquistar autonomia na vida adulta. Jack tenta se manter no mercado de trabalho e organizar sua vida financeira em um momento em que o pai corre sério risco de perder uma batalha contra o câncer. Violet tem o desejo de começar a se relacionar afetiva e sexualmente com um homem, mas enfrenta dificuldades para compreender como criar esses laços de forma real. Harrison lida com agorafobia, compulsão por comida e a dificuldade de aceitação familiar em um lar abastado. A série está disponível na Prime Video.

Atypical e The Good Doctor contam histórias de amadurecimento de adultos autistas

Sam Gardner, de Atypical.  Ao longo de quatro temporadas, encerradas em 2021, Atypical mostra a trajetória do jovem autista Sam em busca de autonomia, com apoio da irmã bissexual que o ajuda a enfrentar a mãe protetora. Vemos a tentativa dele se aproximar amorosamente de uma garota, conquistar o primeiro emprego, sair de casa para morar com o melhor amigo e embarcar numa jornada em busca do maior sonho: conhecer a Antártida. A série está disponível na Netflix.

Shawn Murphy, de The Good Doctor. O brilhante médico Shawn é mais um personagem que alia genialidade em sua área de atuação com dificuldades de interação socioemocional. Ele é um autista com síndrome de Savant. Ao longo da série, que entrará na sétima temporada, Shawn aprende a equilibrar sua inteligência ímpar com a capacidade de lidar com as próprias emoções, as de suas parceiras românticas e as das pessoas com quem convive dentro e fora do hospital. O drama norte-americano foi inspirado em uma série sul-coreana de mesmo nome. A série está disponível no Globoplay.

Doramas ou k-dramas, as séries sul-coreanas, também abordam autismo; A Garota Extraordinária é uma delas

Woo Young Woo, de A Advogada Extraordinária. Mais uma personagem de mente brilhante com problemas para estabelecer laços afetivos, desta vez representada por uma personagem feminina. Woo é capaz de compreender tão detalhadamente cada processo que os casos que caem nas mãos dela sofrem reviravoltas. Quando criança, ela demorou para começar a falar, tinha estereotipias e na vida adulta carrega ainda seu hiperfoco em baleias e sua peculiar maneira de se apresentar como Woo Wong Woo, um nome que se diz da mesma forma de trás para frente e de frente para trás. A série está disponível na Netflix.

Han Geu-ru, de Move to Heaven (A Caminho do Céu). Após a morte do pai, o jovem autista Han Geu-ru conhece o tio, um ex-presidiário, que passa a tomar conta e trabalhar com ele como “limpador de traumas”, retirando os itens deixados por pessoas falecidas. As histórias dos objetos de cada pessoa e a relação construída por tio e sobrinho que ainda estão se conhecendo duram dez capítulos e exigem lencinhos à mão. A série está disponível na Netflix.

Moon Sang Tae, de Tudo Bem Não Ser Normal. Sang Tae é o irmão mais velho de Gang Tae, um agente comunitário de saúde de uma ala psiquiátrica que vive em função do irmão desde a morte da mãe. Sang é fascinado por dinossauros, se apavora com borboletas e assiste diariamente os mesmos desenhos animados. Os dois conhecem uma escritora de livros infantis que tem transtorno de personalidade antissocial. Juntos, os três passam por situações em que lidam com seus medos, traumas e paixões. A série está disponível na Netflix.

Escrito por Clarice Sá, Teia.Work

0 comentários

Enviar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *